Se fosse comigo
Friday, November 24, 2006
  Caráter, releases e plágio
O que fazer com um jornalista que reconhecidamente se apropriou de textos alheios e os publicou como seus? Em grandes jornais do planeta, o respeito às leis de direitos autorais e os códigos internos de ética jornalística levam repórteres e editores a perder o emprego, de forma voluntária ou compulsória. Em um dos casos mais ilustres, o poderoso The New York Times reconheceu em suas páginas que matérias escritas, ao longo de anos, pelo jornalista Jayson Blair continham algumas informações plagiadas e outras simplesmente inventadas. Em 2003, com a descoberta de seus crimes, Blair foi obrigado a pedir demissão.
Na semana passada, um jornal baiano publicou errata na sua página dois informando que dois textos assinados por um de seus repórteres na verdade haviam sido escritos por um oficial da Marinha Brasileira e publicados, no início do corrente ano, em um informativo da instituição. Surpreendido pela usurpação de seu trabalho, o oficial procurou a redação do jornal pedindo, tão somente, que lhe fosse dado o devido crédito. Resolvida a demanda do autor original dos textos, voltamos à pergunta inicial: o que fazer com o jornalista? Segundo o Código Penal, artigo 184, o crime contra o direito autoral prevê aplicação de multa ou prisão de três meses a um ano. De acordo com o Aurélio, plagiar significa "assinar ou apresentar como seu obra de outrem, imitar trabalho alheio". Diferentemente do NYT, o jornal baiano preferiu manter o repórter em seus quadros, dando-se por satisfeito com a publicação da errata.
Na ânsia de defender o jornalista acusado de plágio, alguns (poucos) de seus colegas argumentam que ele não é o único jornalista da casa a incorrer em erro. Para isso, tentam lançar na vala comum atitudes díspares, como a deficiência de apuração no trabalho de um repórter, a publicação de releases (os textos enviados às redações pelas assessorias de imprensa) e os casos de plágio.
Transcrever erroneamente uma declaração concedida por uma fonte porque não entendeu direito o que foi dito e não houve tempo (ou disposição) para refazer a pergunta é um erro profissional sério, que pode ser rotulado como preguiça, negligência ou incompetência. Em casos extremos, pode levar à demissão, se assim considerar necessário a chefia ou o dono do jornal em que trabalha.
Mas esse tipo de erro não pode ser comparado, nem de longe, à prática de jornalistas que distorcem deliberadamente declarações de fontes para que essas se encaixem na linha de pensamento adotada pelo autor da matéria. Ou do recebimento de benefícios pessoais, como almoços e presentes oferecidos em troca de textos elogiosos, sonegação de informações que prejudiquem seus negócios pessoais, escalação de repórteres dóceis para a cobertura de eventos promovidos por assessorias de imprensa ligadas a jornalistas da casa. Isso é falta de caráter.
O uso de releases (como informação publicada) pelos jornais é um delito grave. Contra o leitor. Quem compra um jornal nas bancas ou recebe em casa o seu exemplar de assinatura espera, em tese, que as informações e conceitos emitidos pelo periódico de sua preferência sejam fruto da observação e da experiência cotidiana dos seus repórteres. Nunca de uma idéia concebida por quem faz assessoria de imprensa. Ao leitor, não interessa se o jornalista recebeu uma cortesia para almoçar em um restaurante caríssimo. Ele quer saber se a peça de teatro que ele pretende assistir vale a pena, se a implantação de uma fábrica na sua cidade vai melhorar ou não sua vida, se o prefeito está agindo corretamente ao liberar barracas na areia da praia. Assessores de imprensa nunca vão reclamar da publicação literal de seus textos. Isso é tudo o que querem.
Mas quando o jornalista ultrapassa o limite do plágio, afeta não apenas a credibilidade de um jornal junto aos seus leitores ou a honra de seus colegas de redação, que passam a ser julgados pelas fontes sob a mesma ótica do plagiador. Ele passa a roubar. Toma como seu um trabalho que foi desenvolvido por outro. Jornais que prezam pela sua credibilidade não podem ser lenientes com quem comete crime autoral. É um péssimo exemplo para quem está saindo das faculdades e viu colegas levando zero dos professores por terem copiado trabalhos da internet.
 
Wednesday, November 22, 2006
  O jornalista que copiava
Trabalho no Maior Jornal do Norte e Nordeste do Brasil (MJNNB) há quase cinco anos e já escrevi sobre economia, política, empregos, automóveis, cultura, internacional, geral, Brasil, enfim, quase todas as editorias. Minhas matérias sempre foram muito elogiadas por colegas e leitores, mas eu nunca fui promovido. Continuo ganhando como um repórter em início de carreira. Essa semana, me ocorreu que não vale a pena me esforçar para fazer bons textos, já que aparentemente eu posso escrever qualquer absurdo e continuar empregado no Maior Jornal do Norte e Nordeste.
Esse pensamento me ocorreu depois que o MJNNB publicou, no sábado, dia 18 de novembro, uma errata, reconhecendo que metade de uma matéria escrita por um repórter especial (que ganha quase o dobro do meu salário), sobre o Rio São Francisco, havia sido copiada de um informativo publicado pela Marinha do Brasil no ano anterior. O repórter viajou para o interior, com direito a caixinha "e as porra", e voltou com o texto pronto de outra pessoa e o publicou, sem mudar uma vírgula. A farsa foi descoberta porque o oficial da Marinha, que escreveu o texto quando ainda servia no Rio de Janeiro, agora trabalha no setor de comunicação social do II Distrito Naval e tem por costume ler diariamente os jornais.
O oficial foi até a redação com o texto original em mãos e o mostrou aos editores do MJNNB. A partir daí, foi feita uma busca na internet e se comprovou que o repórter copia há anos textos de assessorias de imprensa, bulas de remédio e receitas de bolo. O jornal publicava os textos como se fossem de seu funcionário e, não raro, as matérias viravam manchete. Dessa vez, ao invés de navegar na internet para pescar matérias prontas, o repórter mergulhou de cabeça no universo dos marinheiros.
Com todas as provas reunidas pelo MJNNB, pensei comigo: agora o jornal vai tomar uma providência! Ainda mais depois de ter pago R$ 600 mil por ter publicado em 1997, sem a autorização do autor, uma foto totalmente descartável de um artista plástico, além de ser obrigado a republicar a foto na capa, com os devidos créditos, cumprindo decisão judicial.
Ledo engano, o repórter especial do MJNNB recebeu da direção do jornal uma segunda chance, depois de ter chorado "copiosamente" (não resisti ao trocadilho) e dito que isso não se repetiria nunca mais. Eram, digamos, águas passadas.
Como não vejo a possibilidade de receber uma promoção, estou pensando em sugerir ao MJNNB a criação de uma editoria CTRL C/CTRL V, para os momentos de aperto. Eu mesmo estou me escalando para o serviço. a nova editoriaI poderia ser de grande valia para uma empresa que não gosta de pagar hora extra. Se não dá para entrevistar uma fonte antes do final do turno de trabalho, recorre-se a uma matéria clonada. O jornal poderia contratar, inclusive, o ex-jornalista do New York Times, Jason Blair, para copiar textos em inglês. Será que vai colar?
 
Palpites sobre sexo, amizade e trabalho

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